quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Momentos de Sabedoria – Maria Auxiliadora Ribeiro Gomes(Viçosa-MG)






Rubem Alves- Para pessoas inteligentes

Compilado por Maria Auxiliadora Ribeiro Gomes(Viçosa-MG)




 
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 Assunto: Fwd: Rubem Alves- Para pessoas inteligentes
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> - Rubem Alves- Para pessoas inteligentes
> Para:PARA PESSOAS INTELIGENTES
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>
> por Rubem Alves
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> Mesmo o mais corajoso entre nós só raramente tem coragem para aquilo
> que ele realmente conhece", observou Nietzsche. É o meu caso. Muitos
> pensamentos meus, eu guardei em segredo. Por medo.
>
> Alberto Camus, leitor de Nietzsche, acrescentou um detalhe acerca da
> hora em que a coragem chega:
> "Só tardiamente ganhamos a coragem de assumir aquilo que sabemos".
> Tardiamente. Na velhice. Como estou velho, ganhei coragem.
>
> Vou dizer aquilo sobre o que me calei: "O povo unido jamais será
> vencido", é disso que eu tenho medo.
>
> Em tempos passados, invocava-se o nome de Deus como fundamento da
> ordem política. Mas Deus foi exilado e o "povo" tomou o seu lugar: a
> democracia é o governo do povo. Não sei se foi bom negócio; o fato é
> que a vontade do povo, além de não ser confiável, é de uma imensa
> mediocridade. Basta ver os programas de TV que o povo prefere.
>
> A Teologia da Libertação sacralizou o povo como instrumento de
> libertação histórica.
>
> Nada mais distante dos textos bíblicos.
>
> Na Bíblia, o povo e Deus andam sempre em direções opostas.
>
> Bastou que Moisés, líder, se distraísse na montanha para que o povo,
> na planície, se integrasse à adoração de um bezerro de ouro. Voltando
> das alturas, Moisés ficou tão furioso que quebrou as tábuas com os Dez
> Mandamentos.
>
> E a história do profeta Oséias, homem apaixonado!
> Seu coração se derretia ao contemplar o rosto da mulher que amava!
> Mas ela tinha outras idéias. Amava a prostituição. Pulava de amante em
> amante enquanto o amor de Oséias pulava de perdão a perdão.
> Até que ela o abandonou.
> Passado muito tempo, Oséias perambulava solitário pelo mercado de
> escravos. E o que foi que viu? Viu a sua amada sendo vendida como
> escrava. Oséias não teve dúvidas. Comprou-a e disse: "Agora você será
> minha para sempre.".
> Pois o profeta transformou a sua desdita amorosa numa parábola do amor de
> Deus.
>
> Deus era o amante apaixonado. O povo era a prostituta. Ele amava a
> prostituta, mas sabia que ela não era confiável.
> O povo preferia os falsos profetas aos verdadeiros, porque os falsos
> profetas lhe contavam mentiras.
>
> As mentiras são doces; a verdade é amarga.
>
> Os políticos romanos sabiam que o povo se enrola com pão e circo.
>
> No tempo dos romanos, o circo eram os cristãos sendo devorados pelos leões.
> E como o povo gostava de ver o sangue e ouvir os gritos!
>
> As coisas mudaram.
>
> Os cristãos, de comida para os leões, se transformaram em donos do circo.
>
> O circo cristão era diferente: judeus, bruxas e hereges sendo queimados em praças públicas.
>
>
> As praças ficavam apinhadas com o povo em festa, se alegrando com o
> cheiro de churrasco e os gritos.
>
> Reinhold Niebuhr, teólogo moral protestante, no seu livro "O Homem
> Moral e a Sociedade Imoral" observa que os indivíduos, isolados, têm
> consciência. São seres morais. Sentem-se "responsáveis" por aquilo que
> fazem.
>
> Mas quando passam a pertencer a um grupo, a razão é silenciada pelas
> emoções coletivas.
>
> Indivíduos que, isoladamente, são incapazes de fazer mal a uma
> borboleta, se incorporados a um grupo tornam-se capazes dos atos mais
> cruéis.
>
> Participam de linchamentos, são capazes de pôr fogo num índio
> adormecido e de jogar uma bomba no meio da torcida do time rival.
> Indivíduos são seres morais. Mas o povo não é moral. O povo é uma
> prostituta que se vende a preço baixo.
>
> Seria maravilhoso se o povo agisse de forma racional, segundo a
> verdade e segundo os interesses da coletividade.
>
> É sobre esse pressuposto que se constrói a democracia.
>
> Mas uma das características do povo é a facilidade com que ele é enganado.
>
> O povo é movido pelo poder das imagens e não pelo poder da razão.
>
> Quem decide as eleições e a democracia são os produtores de imagens.
>
> Os votos, nas eleições, dizem quem é o artista que produz as imagens
> mais sedutoras.
>
> O povo não pensa. Somente os indivíduos pensam.
>
> Mas o povo detesta os indivíduos que se recusam a ser assimilados à
> coletividade.
>
> Uma coisa é a massa de manobra sobre a qual os espertos trabalham.
>
> Nem Freud, nem Nietzsche e nem Jesus Cristo confiavam no povo.
>
> Jesus foi crucificado pelo voto popular, que elegeu Barrabás.
>
> Durante a revolução cultural, na China de Mao-Tse-Tung, o povo
> queimava violinos em nome da verdade proletária.
>
> Não sei que outras coisas o povo é capaz de queimar.
>
> O nazismo era um movimento popular. O povo alemão amava o Führer.
>
> O povo, unido, jamais será vencido!
>
> Tenho vários gostos que não são populares. Alguns já me acusaram de
> gostos aristocráticos. Mas, que posso fazer?
>
> Gosto de Bach, de Brahms, de Fernando Pessoa, de Nietzsche, de
> Saramago, de silêncio; não gosto de churrasco, não gosto de rock, não
> gosto de música sertaneja, não gosto de futebol.
>
> Tenho medo de que, num eventual triunfo do gosto do povo, eu venha a
> ser obrigado a queimar os meus gostos e a engolir sapos e a brincar de
> "boca-de-forno", à semelhança do que aconteceu na China.
>
> De vez em quando, raramente, o povo fica bonito.
>
> Mas, para que esse acontecimento raro aconteça, é preciso que um poeta
> entoe uma canção e o povo escute: "Caminhando e cantando e seguindo a
> canção.". Isso é tarefa para os artistas e educadores.
>
> O povo que amo não é uma realidade, é uma esperança.
>
> Rubem Alves - colunista da Folha de S. Paulo ...
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